sexta-feira, março 21, 2008

Hierocosfinge

Os barcos sulcam as noites brancas com precisão cristalina, o sono passa do meu umbigo para o meu dedo do pé enquanto os pássaros chilreiam uma lenta madrugada. Na opressão de um quarto escuro demais ergo pontes e visões que me ligam ao Tejo. Vejo o trafego nas vias e consigo precisar com exactidão microscópica a vida desses seres de luz, cruzando o azul veludo. Tudo é estático e vazio, até o cotão que invade o dia cessa de existir nestes momentos. Todos os sentidos se agudizam na preparação da obra mental a erguer. Formiga obreira labuto e perco-me em construções dignas da era das maravilhas, em labirintos mitológicos guiado pelo ténue fio de luz. Babilónia do que virá e escombros do passado. Represento papeis, mil vezes representados, é a trágico-comedia da humanidade.

- Olha Mamã! Olha a esfinge! Vê como sou esperto. Consegues ver? Consegues-me ver?

Com gesto de prestidigitação o suspense acaba deixando o corpo ao cansaço liquefeito de um novo dia, o gesto torna-se mecânico e a faísca por lá não habita. Observo a cama quente onde ainda estás, o sono dos justos dizem...

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